Ao sermos interrogados sobre como estamos, é comum respondermos a quem nos interroga de que estamos com pressa, “sempre correndo”. Mas correndo de quem? Correndo para onde? Correndo atrás de quem? Ou nossas respostas estão vazias de sentido ou, talvez, revelem que estamos a correr, desesperadamente, sem rumo e direção.
Não há razões que justificam tanta violência nossa de cada dia que decorre de coisas banais. A violência, transformada em rotina, dá-nos a impressão de que vivemos num tempo em que tudo se pode resolver impondo a força, a esperteza, o despudor, a estupidez ou a eliminação física daqueles que, porventura, “atravancam” o nosso caminho. Mas será que a violência não está a nos revelar que a estupidez é que tomou conta da gente e que o que nos resta é administrá-la? Será possível vencer a estupidez humana?
A estupidez fundamenta-se na ideia de que não sou humanidade, sou somente eu. Se somente é eu que valho, tudo o resto é secundário e, portanto, passível de manipulação. O outro, que se vire, que se imponha, que se apresente como eu. Não sou capaz de reconhecer a minha condição de dignidade humana como algo que depende ou que pode ser complementada na convivência com os outros. Então, se o outro em nada me ajuda, que pelo menos não me atrapalhe. E, se resolver atrapalhar, nada melhor que julgá-lo, humilhá-lo ou mesmo eliminá-lo.
Muito preocupante é que muitos de nossos adolescentes e jovens, a partir das constatações referidas, operam as suas condutas e ideias na mais absoluta relatividade, menos quando se trata da exaltação do próprio eu (egocentrismo). Para muitos, tudo é razão de competição ou de etiqueta. Representar é mais importante do que ser. Ter é muito mais importante do que ser. Viver, na máxima velocidade e intensidade, é o melhor do que se tem para fazer. Então porque pensar no futuro?
Sempre é importante retomar valores que são a base de nossa compreensão de convivência social, como de nossa civilização. A generosidade, o convívio e a compreensão, por exemplo, são geradas pela escutatória. A escutatória é a nossa capacidade de desprender-se um pouco de si para tentar compreender as atitudes e pensamentos dos outros. Mas será que ainda estamos a fim de perder tempo para ouvir alguém? Ainda temos paciência para compreender que determinadas atitudes resultam de nossa vivência pessoal atribulada e pela falta de habilidade de conviver? Ainda seremos capazes de reconhecer que tão importante quanto falar é também saber ouvir?
A violência é a face mais perversa de nossa estupidez humana. Na medida em que viver, matar ou morrer viraram obras do acaso, estamos perdendo a verdadeira noção de humanidade, sempre latente em cada um e cada uma de nós. Esta humanidade, presente e latente em cada um e cada uma de nós, requer ser reinventada e recriada em cada momento histórico. Nem sempre vivemos do jeito que vivemos hoje e, no futuro, poderá ser que viver seja ainda muito mais diferente e complexo.
Vivemos esperando dias melhores. Dias melhores virão se formos capazes de perceber que vivemos enozados, interdependentes, frágeis, desejosos de comunhão e trocas, mesmo que quase todo o mundo conspire contra a gente. Mas somente a espera pode nos cansar. Vivamos, pois, escolhendo caminhos de liberdade; não de estupidez.
Nei Alberto Pies é professor e ativista de direitos humanos.