O racismo enquanto elemento estruturante das relações de poder é parte da formação histórica do Brasil. A formação política do país tem na sua constituição atos extremos de violência e desumanização dirigidos contra negras e negros, a exemplo da diáspora africana e da escravidão negra. Neste processo de formação histórica, os quilombos configuram-se como símbolos da resistência e da insurgência negra, na sua origem, fundados como estratégia de enfrentamento ao sistema escravocrata. Violência radical, insurgência e resistência integram um permanente estado de tensão vivido historica e ininterruptamente pelas pessoas negras no Brasil. Na sua expressão mais grave de desumanização, esse cenário tem sido marcado por assassinatos. Nos processos de resistência e sobrevivência desenvolvidos nos quilombos, as relações culturais, as identidades e os conflitos têm como elemento central os territórios, tensionados por interesses ilegítimos e inconstitucionais de terceiros em disputa pela propriedade da terra.
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A violência contra o quilombo é constante e, nos últimos anos, tem sido marcada pelo aumento exponencial e pela gravidade das situações. Nesse sentido, e com muito pesar, o ano de 2017 foi emblemático para quilombolas de todo o Brasil dado o alarmante índice de violência e assassinatos. Mobilizadas pela urgência e pela necessidade de adoção de medidas para combater esse cenário, junto com outras organizações e movimentos sociais, a Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas (CONAQ) e a Terra de Direitos têm desenvolvido um conjunto de iniciativas buscando denunciar a invisibilização e responsabilizar as autoridades públicas e os demais agentes envolvidos sobre a situação dos quilombos no Brasil.
Com esta publicação inicia-se também um trabalho inédito de coleta e disseminação de dados sobre a violência contra as comunidades quilombolas no Brasil. Trata-se de um esforço contra-hegemônico de visibilizar, dando a conhecer o contexto de luta dos quilombos e o papel desempenhado por suas lideranças na defesa de seus territórios. Pretendemos, ainda, contribuir com a produção de um conhecimento estrategicamente situado, isto é, que a partir de situações de opressão, potencializa ferramentas de luta e de denúncia, interagindo de maneira proativa com o contexto e sua gravidade. Não existem dados públicos e oficiais seguros quanto ao contexto amplo de violência que atinge os quilombos no Brasil. Por essa razão, o esforço investigativo desta pesquisa desdobrou-se em ao menos duas frentes, autoproduzir e sistematizar dados primários sobre as violações e, ainda, disputar a legitimidade do que seriam fontes legítimas e autorizadas a nomear e numerar a gravidade e a realidade das condições de vida dos quilombos.