No momento em que o mundo se depara com a perda progressiva de direitos sociais, rendidos aos interesses do sistema financeiro, Silvio Tendler vai direto ao ponto que atinge toda a sociedade, independente de posicionamento político, com o lançamento de “Dedo na Ferida”.
O documentário, patrocinado pelo Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge) e a Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge), selecionado para a mostra competitiva do Festival do Rio, traça um panorama do cenário contemporâneo com depoimentos de economistas que estão ou que já estiveram em cargos importantes no mundo e pensadores respeitados.
Trailer do documentário
O novo documentário de Silvio Tendler, reconhecido por mais de 80 obras de cunho histórico e social, aborda a influência do capital na política.
– É uma crítica à política dominada pelo sistema financeiro. Você não discute mais o dinheiro a serviço da produção”, diz Tendler, lembrando que se trata de um fenômeno mundial. “Acho que é a primeira vez que vamos discutir com profundidade a força do sistema financeiro na economia.
Para traçar um paralelo entre essas análises e o cotidiano dos afetados pelos poderio econômico, Silvio usa como fio de ligação a viagem de trabalho de um podólogo que mora em Japeri – cidade que tem o pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) do Estado do Rio de Janeiro – até Copacabana, onde exerce sua profissão.
– O tempo de deslocamento dele todo dia é o tempo de uma sessão de cinema. É o tempo que ele não vai ao cinema. Enquanto ele vai de Japeri à Copacabana poderia estar assistindo ao filme. “Dedo na Ferida” discute uma sociedade na qual ele é um cidadão à margem, ele não tem uma conta no banco, ele não vai ao cinema, nem ao teatro. Não tem uma vida ativa, é um cara que trabalha para sustentar a família. Acredito que uma das reflexões para quem assiste ao documentário é as pessoas perceberem que está na hora delas terem uma vida interessante também, acredita Silvio Tendler.
Entre os depoimentos da obra estão os de Yanis Varoufakis, ex-ministro das Finanças da Grécia; Celso Amorim, ex-ministro das Relações Exteriores do Brasil; Paulo Nogueira Batista Jr, vice-presidente dos banco dos Brics; o cineasta Costa-Gavras; os intelectuais Boaventura de Sousa Santos (Universidade de Coimbra, Portugal), David Harvey (University of New York, Estados Unidos) e Maria José Fariñas Dulce (Universidade Carlos III, Espanha); os economistas Ladislau Dawbor (PUC-São Paulo), Guilherme Mello (Unicamp) e Laura Carvalho (USP), entre outros pensadores que interferem no mundo contemporâneo.
Novos frutos na parceria com o movimento sindical
Ampliar o debate com a sociedade brasileira sobre os crimes cometidos pelo sistema financeiro internacional em sua trajetória de semear a miséria em todos os continentes foi um dos principais motivos para que nascesse mais uma parceria do Sindicato dos Engenheiros no Estado do Rio de Janeiro (Senge-RJ) e da Federação Interestadual de Sindicatos de Engenheiros (Fisenge) com Silvio Tendler. Juntos, em 2014, produziram o documentário “Privatizações – A Distopia do Capital”. Em 2017 assinam o “Dedo na Ferida”.
“Fundamentalmente quando pensamos no filme “Dedo na ferida”, o que nos moveu foi a necessidade de promover o debate no Brasil sobre um tema tão árido e tão distante da população. A captura dos governos nacionais pelo capital financeiro internacional é algo concreto, é algo evidente, mas que poucas pessoas enxergam. Queremos discutir isso com a população”, afirma Clovis Nascimento, presidente da Fisenge.
“É urgente popularizar, levar as informações da situação que o Estado brasileiro vive para a maioria das pessoas. O cinema, sua narrativa didática, permite isso. A proposta é que a exibição do “Dedo na Ferida” abra portas para debates em amplos segmentos sociais, para que seja apropriado por todos. As pessoas têm que ter consciência do que está ocorrendo. Para que, a partir da consciência, tenham capacidade de se indignar, de se mobilizar, de se rebelar e, talvez, fazer ecoar o grito de ‘BASTA’ nisso tudo que vivem hoje”, defende Olímpio Alves dos Santos, presidente do Senge-RJ.
Para economista e professora Annyeli Nascimento, Secretária Adjunta de Cultura da CUT, essa iniciativa é muito importante na atual conjuntura: “O documentário consegue explicar como o processo de financeirização acentua as desigualdades e impacta diretamente nas condições de vida da população”.
Sinopse
“Dedo na Ferida” trata do fim do estado de bem‐estar social e da interrupção dos sonhos de uma vida melhor para todos em um cenário onde a lógica homicida do capital financeiro inviabiliza qualquer alternativa de justiça social. Milhões de pessoas peregrinam em busca de melhores condições de vida enquanto o capital só aspira a concentração da riqueza em poucas mãos. Neste cenário de tensões sociais, intelectuais lutam para transformar o mundo levantando temas como os fim dos direitos sociais, o desemprego, o mercado e o ressurgimento de movimentos extremistas.
Biografia
Em 48 anos de carreira, Silvio Tendler produziu e dirigiu cerca de 80 obras de cunho histórico e social entre curtas, médias e longas-metragens e séries. Licenciado em História pela Université de Paris VII, é mestre em Cinema e História pela École des Hautes-Études/Sorbonne. Desde 1979 é professor do Departamento de Comunicação Social da PUC-Rio. Tem mais de sessenta prêmios, entre eles seis Margaridas de Prata, da CNBB.
Filmografia
Silvio Tendler fez as três maiores bilheterias do documentário brasileiro. “Jango” recebeu o Margarida de Prata e o melhor filme do Júri Popular do Festival de Gramado. “Glauber–O filme, labirinto do Brasil” foi eleito melhor filme pelo júri popular e a crítica do Festival de Brasília e participou da Seleção Oficial Hors concours do Festival de Cannes. “Encontro com Milton Santos” venceu o Festival de Brasília e levou o prêmio de melhor filme no Festival de Documentários Santiago Álvarez.