Centro de Apoio e Desenvolvimento do Negro é lançado em Passo Fundo

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Publicada originalmente em O Nacional, no dia 20 de maio de 2019, por Claudia Dalmuth/ON; Crédito: Gerson Lopes/ON

Iniciativa foi lançada no último sábado (18), na sede do grupo Garotos da Batucada, com a presença de autoridades do município e representantes de entidades da região.

Entre as vítimas da desigualdade social enfrentada no Brasil, a população negra é a que mais sofre com as consequências, seja na esfera política, social ou econômica. Nos índices de violência, por exemplo, um levantamento feito pelo Fórum de Segurança Pública aponta que mais de 70% das vítimas anuais de homicídio no Brasil são pessoas negras. O índice majoritário é expresso também no quadro de desemprego: segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a cada três brasileiros desempregados, dois são negros. É para desenvolver ações de redução dessa desigualdade que um grupo de militância negra tem articulado em Passo Fundo o Centro de Apoio e Desenvolvimento do Negro (CEADENE). A iniciativa foi lançada no último sábado (18), na sede do grupo Garotos da Batucada, com a presença de autoridades do município e representantes de entidades da região.

De acordo com o presidente do CEADENE, Ipácio Carolino, o grupo começou a se formar em dezembro do ano passado e, no momento, tem focado o trabalho na divulgação da ideia, buscando apoio do poder público e da iniciativa privada para viabilizar seus projetos e encontrar um espaço que sirva como sede. As ações, que devem sair do papel ainda neste ano, incluem atividades educativas, oficinas artísticas e iniciativas de elevação da autoestima da pessoa negra, além do desenvolvimento de projetos voltados à juventude na intenção de formar novas lideranças do movimento negro. “Somente através da conscientização conseguimos mobilizar as pessoas para que se reconheçam enquanto sujeitos e busquem fazer valer os seus direitos, fazendo com que outras pessoas também entendam as nossas necessidades e reconheçam que nós, negros, estamos sempre em desigualdade e que isso não é justo. Isso não pode ser entendido como normal”, esclarece.

O presidente esclarece ainda que o CEADENE tem trabalho junto ao IBGE e a entidades de classe locais para estudar dados acerca da realidade passo-fundense com o objetivo de compreender quais são os agentes que geram uma dificuldade tão expressiva para inserção dos negros no mercado de trabalho e nas universidades. “Quando o negro consegue se inserir, ele costuma receber menos que o branco e raramente ocupa um cargo de liderança. Normalmente, é uma função subalterna. Mesmo você tendo capacidade igual ou superior a um branco, em um processo seletivo você já está em desvantagem pelo simples fato de ser negro. Isso se deve a um processo histórico. Depois da abolição da escravatura, não houve uma política de reparação aos negros – naquela época, os negros não tinham acesso à educação, eles eram proibidos, e isso gera reflexos até hoje. É por isso que a gente luta tanto por políticas públicas. As cotas, por exemplo, não são um privilégio. Elas são uma tentativa de reparação histórica”, elucida.

Apoio a imigrantes

Se brasileiros negros sofrem as consequências de uma visão racista que está enraizada na sociedade há séculos, os imigrantes negros são duplamente vitimados por esses reflexos. Ao racismo, somam-se os casos de xenofobia. Ipácio cita a realidade enfrentada pelos haitianos e senegaleses que vivem em Passo Fundo e que sofrem dificuldades de acolhimento por parte da população. “Muitos deles têm sofrido de depressão”, comenta. “O Brasil é signatário de acordos que o obrigam a acolher imigrantes, mas falta preparo para trabalhar com essas questões. Os imigrantes precisam encarar uma série de dificuldades quando chegam aqui: eles têm dificuldade com a língua, com a distância da sua terra natal e, além de tudo isso, enfrentam uma resistência muito grande da comunidade local”.

Por esse motivo, os voluntários do CEADENE têm planejado também uma série de ações especialmente voltadas ao povo estrangeiro que vem ao município em busca de uma nova vida. “Eles não causem problemas, não se envolvem em questões de violência e são descritos como excelentes trabalhadores. Então eles precisam ser respeitados e acolhidos. Nós temos sim dificuldades internas, mas eles não vieram aqui roubar empregos, como muitos dizem. Queremos que o CEADENE sirva como um espaço que abriga esses imigrantes e, também, que conscientiza a população acerca dessa questão”.

Embora o Centro seja organizado por negros e os projetos sejam voltados a esse público, Ipácio finaliza esclarecendo que não se trata de um grupo excludente. “Até porque vivemos relacionamentos inter-raciais. Então não é a quantidade de melanina que vai nos pautar, é a condição do elemento que se autodeclara negro ou, então, que é pobre, vive na periferia e se sente excluído.

Todos podem fazer parte da CEADENE”, salienta. O  grupo deverá lançar, em breve, uma página na internet para divulgar os futuros projetos.

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