A Comissão de Cidadania e Direitos Humanos (CCDH) da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul discutiu, nesta quarta-feira (12), o Plano Nacional de Segurança proposto em janeiro pelo governo federal. O encontro foi solicitado pelo Conselho Estadual de Direitos Humanos, que denunciou falta de transparência dos governos estadual e federal em relação à política pública.
“O plano é uma portaria com quatro artigos, dois considerandos e 13 slides. Mais de 70% do que propõe já foi previsto pelos planos anteriores e está muito aquém do que a sociedade aspira”, analisou Paulo Carbonari, presidente do órgão.
Ex-vereador de Porto Alegre e ex-secretário de Segurança Pública de Canoas, Alberto Kopitkke, que tem se dedicado à área da segurança pública e foi chamado pela comissão para palestrar sobre o assunto, fez um alerta de que o plano não traz propostas estruturantes capazes de mudar a realidade da segurança no Brasil e é o pior dos projetos federais já apresentados para a área nos últimos 25 anos.
“Esse é o quarto [plano] nacional que o Brasil tem nos últimos 25 anos. Infelizmente, esse é o pior deles. É meramente um plano de compras. Uma lista de compras para os estados que não tem nenhuma capacidade de modificar a segurança pública no Brasil, de dar efetivamente um rumo para a segurança, orientar uma remodelação, seja na formação, seja na valorização dos policiais, na remodelação da forma de fazer policiamento, na prevenção. É meramente um plano de compra de viaturas, mais do mesmo. Infelizmente é isso”, avaliou Kopitkke.
Diante do aumento do poderio de organizações criminosas com alcance nacional, Kopptike avalia que um plano nacional precisaria avançar no sentido de estruturar um sistema nacional de inteligência e de um sistema de padronização e avaliação das polícias brasileiras, aos moldes do que ocorre nos Estados Unidos e na Inglaterra. “Os EUA, desde 2004, têm uma padronização para medir a eficiência, a eficácia e a legitimidade das polícias. As que não seguem, sofrem exatamente para conseguir provocar esse salto de qualidade. Ao mesmo tempo, o governo federal tem que investir recursos de fatos, não meramente recursos pontuais como fez agora com esse plano, que não tem nenhuma capacidade de mudar a realidade que a gente vive hoje”, disse.
Apresentado em janeiro pelo então Ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, o plano tem o objetivo de reduzir homicídios dolosos e feminicídios, o combate integrado à criminalidade organizada e a racionalização e modernização do sistema penitenciário. Um dos principais pontos do plano é o investimento de R$ 200 milhões para a construção de cinco novos presídios federais, um em cada uma das regiões do país. Também está prevista a liberação de R$ 150 milhões para a instalação de bloqueadores de telefone celular em 30% dos presídios estaduais e R$ 80 milhões para a compra de aparelhos de raio-x que evitariam a entrada de armas e aparelhos de comunicação nas penitenciárias.
Kopptike lembra que no primeiro plano nacional de segurança, desenvolvido durante o governo Fernando Henrique Cardoso, houve uma preocupação de tratar a questão de forma mais ampla, unindo vários ministérios. Na sequência, o plano elaborado pelo sociólogo Luiz Eduardo Soares, em 2002, teve o objetivo de organizar critérios e trazer obrigatoriedades para os Estados. O terceiro, o Pronasci (Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania), de 2007, teria tido o mérito, segundo Koptikke, de avançar em questões previstas nos anteriores e garantir um maior volume de recursos para a área.
“Agora, no quarto plano, a gente não tem nada disso. É meramente um plano factoide para a mídia e o Brasil, mais uma vez, vai passar um período sem nenhum tipo de resposta. Isso, infelizmente, já vem desde o governo Dilma, é preciso ser dito, quando acabou o Pronasci. Desde então não se criou nenhum plano e agora, o governo Temer, pega as propostas que estavam na mesa, guardadas, um plano meramente de aquisições, e divulga como se fosse um plano nacional”, afirmou.
Koptikke critica ainda o fato de o plano de Temer não trazer propostas de valorização das carreiras policiais, como o estabelecimento de um piso nacional e a exigência de ensino superior para solados, a ser financiada pela União.
Já a defensora pública Mariana Capellari ponderou que o poder público deve refletir sobre “quem vem sendo preso” majoritariamente e “para que fins está servindo a prisão no Brasil”, e defendeu também uma discussão sobre a política de drogas no País, dois temas que não estão presentes no plano.
Representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Leandro Soares salientou que a segurança deve ser encarada como política de estado e não de governo. “Não bastam policiais e armamentos. Precisamos de boas práticas e de uma polícia cidadã, menos truculenta e mais próxima da comunidade”, disse.
A delegada da Polícia Civil, Eliane Lopes, reconheceu que a descontinuidade das políticas por conta das trocas de administrações prejudicam o trabalho na área. Ela também disse que não houve discussão com os operadores da segurança sobre a implantação do Plano Nacional de Segurança no Rio Grande do Sul. “O plano não traz novidades. No Estado, estamos priorizando a prevenção primária com a participação dos municípios e sistematizando as ações e projetos desenvolvidos pelos órgãos governamentais e pela sociedade”, apontou.
A CCDH decidiu formar um Grupo de Trabalho, coordenado pela deputada Míriam Marroni (PT) e integrado por representantes de entidades presentes, para dar continuidade ao debate sobre a formulação de um plano de segurança pública em consonância com os direitos humanos.